sexta-feira, 15 de maio de 2009

A Fastnet Race











Fotos por Carlo Borlenghi A chegada no quebra mar de Plymouth e a largada em Cowes, em cima o Rambler e o Leopard os primeiros na marca.

Como nestes meses de outono não temos feito regatas (acabamos não indo para Búzios e Ubatuba), esse blog acabou por ir na direção da filosofia da vela e dos sonhos de velejador.
Depois de uma regata calma, em barcos históricos, em um dos mais encantadores lugares do Mediterrâneo, vamos ao tipo oposto de sonho do velejador de regata. Não há um verdadeiro regatista que nunca sonhou com a Fastnet, nem que seja como pesadelo.

A Fastnet é a mais antiga e mais prestigiosa das grandes regatas de oceano. Começou em 1926, ensejando a criação da RORC, e desde então, com a interrupção da 2ª Guerra, vem sendo disputada como um evento bianual. È um percurso de 607 milhas, por aguas que podem ser perigosas, e que colocam um importante desafio estratégico e de habilidade marinheira aos eventuais competidores. Na ultima edição a largada regata foi atrasada de 48 horas devido aos avisos de mau tempo. É uma regata para ser levada a sério.

A regata sai de Cowes na ilha de Whright, no Canal do Solent, o berço da vela oceânica de regata. A Maré é um elemento tão importante no Solent, (chega a 5 nós) que o horário da largada é dado pelo inicio da vazante, para facilitar as primeiras horas da regata e a passagem pela ponta de Needles (agulhas) no final da Ilha, onde as águas são particularmente turbulentas. Entrando no canal da Mancha as dificuldades continuam e a flotilha tem de enfrentar as fortes correntes de maré e o tempo imprevisível da costa inglesa do Canal, com vários Cabos a ser ultrapassados. Depois do Land's End, limite oeste da costa inglesa, entra-se nos chamados Western Approaches (entrada oeste do canal da Mancha), onde a violência das depressões do atlântico norte encontra uma verdadeira barreira na entrada da Mancha, muito mais rasa. Isso aliado ao encontro com as águas do canal da Irlanda (costa oeste inglesa), cria as condições para a formação de um mar grosso e quando tempestuoso, dos mais perigosos do planeta, o que pode ocorrer mesmo em Agosto, no meio do verão. 150 milhas a frente está o farol da Fastnet, que marca o extremo sul da Irlanda. A visão do farol com mais de 50 m de altura, sobre a imensa pedra negra, isolada da costa é majestosa e muitas vezes sinistra, rivalizando com o Horn, no imaginário dos velejadores de regata. Às vezes seu poderoso facho de luz pode ser visto a mais de 20 milhas de distancia, piscando a cada 5 segundos, às vezes, com mau tempo ou neblina, só é visível de muito perto ou mesmo só se pode ouvir o triste gemido de sua buzina. A volta, depois de passar por uma spare bouy, a umas poucas milhas a WSW, para evitar os veleiros ainda vindo, a flotilha se afasta da costa da Irlanda, para outra longa perna de mar aberto em direção a Bishop Rock, no extremo sul das ilhas Scilly nos Western Approaches e daí para a costa Inglesa da Mancha, chegando na baia de Plymouth. A partir das ilhas Scilly, as correntes de maré começam a se fazer sentir novamente e a tática escolhida para se entrar no Canal é fundamental para o sucesso. Daí para frente ainda faltam umas 50 milhas para a chegada, com todos os desafios de uma regata costeira. A linha fica no quebra mar da base naval de Plymouth.

Para aumentar ainda mais o prestigio desta regata, ela desde 1959, foi a regata final (a longa) da Admiral Cup, evento quadrianual, que reune na mais renhida competição, flotilhas nacionais de 4 barcos escolhidos para representar o seu país, nessa espécie de campeonato mundial de vela de oceano. Na Fastnet de 1979, onde largavam os barcos de regata da Admiral cup e outros quase 200 barcos, a flotilha foi atingida pela pior tempestade da história da regata. Durante a noite, perto da Fastnet rock, quando os barcos mais rápidos já estavam no caminho de volta e os menores estavam passando pelas mesmas águas, ainda indo, a passagem de uma depressão provocou ventos de mais de 40 nós e uma mudança de 90º em sua direção, resultando em um mar enorme e desencontrado, com muitas ondas quebrando, de tamanho e direção imprevistas. 23 veleiros naufragaram ou foram abandonados e 15 pessoas morreram. A violência das ondas quebrou lemes e mastros, virou e inundou barcos, rompeu cintos de segurança e lançou ao mar tripulantes. Muitos acidentes ocorreram no processo de abandono e lançamento dos botes salva vidas. Os helicópteros do serviço de salvamento fizeram dezenas de missões, evitando uma perda ainda maior de vidas.
A Fastnet de 1979, ficou na historia e foi determinante no desenvolvimento de regras e exigências de segurança mais estritas, de novos equipamentos e da construção de veleiros mais seguros, mudando exigências da regra IOR e eventualmente levando (uma década depois) a sua substituição.

De qualquer forma, sendo uma das mais duras regatas de oceano, a Fastnet, apesar de seu facínio, costuma ficar no domínio dos sonhos. Eu uma vez planejei fazer, não a Fastnet, mas um cruzeiro nas mesmas águas, na costa da Irlanda. Falando com um amigo, mais experiente e realista, logo desisti. - Você está louco? ele disse. - Eu não sabia que você era masoquista! Vamos velejar no Caribe que é lindo, o mar e o vento, ao menos no 1º semestre, são perfeitos, é quente e tem sempre sol.

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